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Filiação Socioafetiva

Ultrapassando a ótica biológica, a filiação socioafetiva ganhou espaço e legitimidade no direito brasileiro. Até alcançarmos o atual reconhecimento jurídico do afeto, muitos caminhos foram trilhados justamente para se comprovar que a filiação também pode nascer de laços de amor e não apenas de laços sanguíneos.

Conceitualmente falando, a filiação socioafetiva é a constituição de laços familiares por meio de vínculos afetivos, é possuir o estado de filho não por origem sanguínea, mas sim por laços de afeto, cuidados, carinho e respeito ao longo do tempo.

A filiação socioafetiva é a construção da realidade fática, que passa a necessidade de reconhecimento, ou seja, a função de pai e/ou mãe é exercido em plenitude, o filho é tratado e apresentado como tal, apresenta-se como membro daquela família, sente-se e é reconhecido pela sociedade como parte dela.     

Com o advento da Constituição Federal (1988), seus arts. 1º, III, e 227, caput e § 6º, ao tratarem do princípio da dignidade da pessoa humana e da igualdade entre os filhos independente da filiação, reconhece que esta possui várias origens, biológicas ou não, consagrando, inclusive, o princípio da afetividade.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), em seus arts. 4º, 20 e 27, também passou a tratar da igualdade entre os filhos, proibindo quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação, garantindo a crianças e adolescentes proteção, dignidade, cuidados, além de tratar do estado de filiação como um direito personalíssimo, indisponível e imprescritível.

Já o Código Civil (2002), quando dispõe em seu art. 1.593 que “O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consangüinidade ou outra origem”, deu a possibilidade de se estabelecer outro tipo de filiação que não seja sanguínea. O art. 1.596 do mesmo diploma legal, prevê que “Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”, reproduzindo o disposto na Constituição Federal quanto a igualdade entre filhos, sejam eles biológicos ou adotados.

Assim, por meio da junção interpretativa e aplicação efetiva dos vários diplomas legais, doutrina e jurisprudência, a filiação socioafetiva ganhou reconhecimento ao longo dos anos, inclusive nos dias atuais a mesma pode ser concretizada por vias judiciais (processo) e extrajudiciais (cartórios de registros civis, conforme Provimentos 63/2017 e 83/2019 do CNJ).