A ambição de perfeição da prestação jurisdicional sempre assentou no anseio social de solução de conflitos em caráter terminativo, isto é, pelo deslinde do mérito da matéria posta em discussão judicial. Esta é, por assim dizer, a concretização do dever estatal de pacificação social.
Esse dicere do Estado submete-se, todavia, a uma série de requisitos legais de natureza formal, sistematizados numa ordenação de passos e procedimentos de observância obrigatória, as chamadas questões antecedentes ou processuais, que reclamam solução preferencial e interrompem a trilha do mérito, ora atrasando a sua solução, ora impondo solução com base em razões estranhas ao direito material.
Por qualquer das duas ordens de razão, fica a jurisdição exposta às conhecidas e repetidas críticas de demora ou de ineficácia. Além disso, qualquer solução processual extra mérito compromete o dever de distribuição de paz social, que ao Estado cabe desempenhar como uma das suas bases de sustentação.
Na busca de celeridade e efetividade, dois bastiões do CPC/2015, o legislador voltou os olhos, com especial atenção, para esse aspecto, objetivando a um só tempo evitar – ou minimizar – a contumaz utilização de expedientes processuais como meio de impedir ou retardar a solução do mérito e assim entregar à sociedade a prestação jurisdicional em seu modelo ideal: com o deslinde da questão de mérito posta em discussão.
A supremacia dessa intenção se faz presente em vários momentos do novo caderno de processo, a começar pelo artigo 4º, cujo discurso informa que “as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa." Logo em seguida o artigo 6º estabelece que "todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva."
Isso não significa dizer que o juiz deve fechar os olhos ao seu dever de observância dos pressupostos processuais inerentes à sanidade do processo. Eles existem, são importantes e estão previstos e disciplinados no mesmo Código, a exemplo daqueles do art. 485, que impedem a solução na ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, de legitimidade ou de interesse processual, ou diante da litispendência, da coisa julgada, da convenção de arbitragem e da morte da parte nas ações intransmissíveis.
O que muda, em síntese, é a forma de saneamento dessas questões e de superação de outras de menor relevância mas nem por isso desimportantes. Para isso o juiz dispõe da regra prevista no inciso IX do artigo 139: "O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: (...) IX – determinar o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outros vícios processuais;"
Isso importa numa espécie de liberdade vigiada outorgada ao julgador para possibilitar soluções imediatas e práticas de questões de ordem meramente processual e com isso acelerar a corrida em direção ao julgamento do mérito, em lugar de voltar alguns passos e recomeçar o procedimento, muitas vezes com evidente prejuízo à celeridade e à eficácia do processo.
Essa regra se estende aos Tribunais, inclusive aos superiores, aos quais o CPC/2015 entrega os artigos 932, 938 e 1029, todos inovadores e permissivos em relação ao aproveitamento de recursos, como forma de privilegiar a solução do processo pelo mérito, que é, como dito antes, a suprema ambição do direito.