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A Advocacia Depois do Vírus

Pensar sobre o futuro da advocacia não é um exercicio novo. Todos nós advogados o fazemos constantemente. Mas pensar a advocacia como um ofício novo que a pandemia gestará, isso sim, é um exercicio para o qual é necessária uma boa dose de futurologia.

 

O imprevisivel, é um fenômeno que a filosofia, desde PIERCE, analisa como antítese do chamado determinismo filsófico, para tentar entender como eventos não imaginados e não sujeitos ao domínio da ciência ou ao voluntarismo humano atuam,  muitas vezes em proporções tão elevadas que transformam a própria história da humanidade.

 

É o que se vive hoje. O vírus que se adonou do mundo, muito de repente e sem que o tivessemos percebido, é um típico exemplo do acaso cavalgando um fato que modificará definitivamente a nossa vida no planeta.

 

Pode-se dizer sem medo de errar que uma espécie de futuro está começando agora e nele todas as relações humanas serão diferentes, como, aliás, já se mostram, no momento atual, as relações afetivas, amorosas, comerciais, sociais, financeiras, enfim, as relações humanas já estão desde agora em nova confguração e assim doravante será.

 

A advocacia, como todos os demais ofícios do homem,  não poderia estar imune a essa nova era.

 

Advogar sempre foi um exercício de proximidade, do olho no olho, de presença física. A entrevista com o cliente, a criação da empatia entre a história que o mobiliza e a sensibilização do advogado, a busca no fórum pelo despacho com o juiz, o discurso na tribuna, com que o causídico busca convencer o tribunal da procedencia da sua tese, tudo isso faz da advocacia, assim como da medicina, um ofício que se desenvolve na força da presença e na firmeza do olhar.

 

Doravante, com muita certeza, não mais será tanto assim.

 

De certa forma ja estávamos vivendo, ainda que não em plenitude, o tempo da chamada tele-medicina, cujo paralelo na advocacia, mutatis mutandis, é o processo virtual: a visita ao fórum para consultar e retirar autos e praticar outras diligências em cartórios cedeu espaço ao trabalho remoto, em que se economiza tempo e esforço fisico e se ganha em agilidade na prática de atos que podem ser encaminhados até mesmo no silêncio da madrugada.

 

Agora que o vírus nos trancou em casa, os escritórios estão fechados mas os processos não deixaram de avançar, na medida em que as sessões de julgamento e parte das audiências estão sendo viabilizadas através dos canais virtuais que a tecnologia pôs a nossa disposição.

 

De repente esse vírus demonstrou, de um lado, que é possivel advogar quase que inteiramente à distância; de outro, que isso pode ser aprimorado para que aquilo que ora se faz por uma circunstância temporária passe a se fazer como rotina operacional. 

 

Aliás, o próprio Presidente do STJ, Minsistro João Otávio de Noronha, em recente encontro virtual promovido pelo CESA – Centro de Estudos das Sociedades de Advocacia, a isso se referiu como se fosse fato consumado.

 

De fato, a mudança se mostrou viável e será massificada muito antes do que poderíamos supor. “O homem é o homem e suas circiunstâncias”, ja disse Ortega e Gasset.

 

Assim como o ensino, o delivery de tudo o que for transportável, a consulta médica, as sessões de terapia e outras inúmeras atividades humanas, também a advocacia passará a se fazer remotamente, incluídos os despachos entre advogados e juizes, as entrevistas entre advogados e clientes, a contratação e o credenciamento via instrumentos de mandato, enfim, a presença física será restrita àquilo que for absolutamente indispensável para o aperfeiçoamento da atividade jurídica.

 

Em lugar de sedes gigantescas e luxuosas, os escritórios investirão em parques tecnológicos avançados, capazes de propiciar arquivos, pesquisas, conversas e controles à distância. A jurimetria, a que já nos haviamos reportado neste espaço, será posta ao alcance de todos, facilitando o exercício da distribuição de justiça.

 

Estaremos ainda nos foros e tribunais, assim como os médicos estarão nos consultórios e hospitais. Mas com certeza estaremos muito menos do que até ontem estivemos.

 

A adequação dos escritórios, tanto quanto a espaços físicos como em relação às novas janelas temáticas, é um capítulo que merece muita reflexão e nós advogados teremos que exercitar para sobreviver.