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RETROATIVIDADE E EFEITO IMEDIATO DA NORMA NOVA - II

Mas o que falar da retroatividade e do efeito imediato da norma nova quando se deparáramos com uma relação jurídica de trato sucessivo?

Analisemos, ab initio, a retroatividade. Dito fenômeno jurídico, obviamente, traduz o revés da irretroatividade, caracterizando-se pelo avanço da lei sobre atos e negócios jurídicos aperfeiçoados antes de sua vigência.

A retroatividade, nestes moldes, significa dizer que uma lei passará a regular não apenas atos e negócios futuros, mas também regerá, de imediato, acontecimentos jurídicos ocorridos durante a vigência da lei anterior.

Não foi, como visto, a regra eleita tanto pelo legislador ordinário quanto pelo Poder Constituinte de 1988, por violentar a segurança das relações jurídicas em suas diversas naturezas.

Entretanto, há autorizadas vozes em defesa da retroatividade das leis em especiais situações. Citemos, neste estudo, os escólios de SILVIO RODRIGUES (1998, p. 30-31), que defende a retroprojeção de lei reguladora de casos de interesse social (leia- se ordem pública), pugnando pela constitucionalidade da lei retroativa:

Muitos espíritos liberais combatem, genericamente, a possibilidade de a lei retroagir, mas não me parece evidente a sua razão. Colin e Capitant, argumentando na defesa da lei retroativa, sustentam que, como a lei nova se supõe melhor do que a anterior, e por isso mesmo é que se inovou, deve ela aplicar-se desde logo. Tal argumento, a meu ver, é irrespondível. De resto, a lei nova atende, em geral, a um maior interesse social, devendo, por conseguinte, retroagir.
Alias, em casos de interesse social, deve a lei nova ter aplicação imediata. Assim, por exemplo, a lei que traga um novo impedimento matrimonial deve ser aplicada incontinenti, porque a razão que
conduziu o legislador a criá-lo é de evidente interesse social. Do mesmo modo, a lei que veda o divórcio, ou que o permite, deve, fora de dúvida, ter aplicação imediata. Apenas, permitindo a retroatividade da lei, deve-se preservar aquelas situações consolidadas em que ointeress e individual prevalece.
Entre nós a lei é retroativa, e a supressão do preceito constitucional que, de maneira ampla, proibia leis retroativas constitui um progresso técnico. A lei retroage, apenas não se permite que ela recaia sobre o ato jurídico perfeito, sobre o direito adquirido e sobre a coisa julgada.

Inobstante os argumentos expendidos, SILVIO RODRIGUES (1998) peca ao olvidar o preceito insculpido pelo art. 6.º da atual LINDB, que, textualmente e às claras, veda a retroatividade das leis.

E mais: apenas para efeito elucidativo, trazemos à baila o que lecionam PABLO STOLZE GAGLIANO e RODOLFO PAMPLONA FILHO (2002, p. 79), citando HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, a respeito da retro-operação de leis novas dispondo sobre matérias de interesse social:

Nem mesmo o Estado poderá pretender retroagir os efeitos de uma nova lei para atingir situações definitivamente constituídas, razão por que nos insurgimos, com todas as nossas forças, e por amor à Constituição Federal, contra a falaciosa justificativa de que se deve reconhecer a retroação de efeitos somente às leis de “ordem pública”.
“Não há na carta magna”, pondera Humberto Theodoro Jr., “dispositivo algum, no campo da intervenção econômica, que autorize o legislador, a pretexto de ordem pública, a ignorar os direitos fundamentais que a própria Constituição institui, para servir de base ao sistema normativo da nação”.

Antes do advento da Lei de Introdução do Código Civil, destaque-se, foram pelo Poder Legiferante inseridos em nosso organismo jurídico vários atos normativos com alcance retroativo, como, por exemplo, a Lei de Usura (art. 3.º), o Decreto-Lei n.º 1.907/39, o Decreto-Lei n.º 3.200/41, o Decreto-Lei n.º 3.259/41, (art. 13), dentre outros.

CONCLUSÃO NA PROXIMA COLUNA