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PANDEMIA E SUSTENTABILIDADE FINANCEIRA DOS MUNICÍPIOS: A REPARTIÇÃO DO VALOR ADICIONADO FISCAL DE ICMS EM SERGIPE

A coluna já havia abordado esse tema quando do envio da PEC 188/2019 pelo Presidente da República ao Congresso Nacional, em que se abriu franco debate acerca da sustentabilidade financeira de inúmeros municípios brasileiros.


Hoje esse debate ficou no esquecimento, até porque aquela emenda descansa em sono profundo numa das inúmeras gavetas do parlamento, dado o seu caráter altamente inflamável em relação à possibilidade de extinção de parte dos pequenos municípios do país, contrariando iinteresses diversos e multiformes.


Mas a incerteza quanto à sustentabilidade, desses e dos demais municípios brasileiros, agora se acentua pelo enfraquecimento da economia, atingida pela crise sanitária decorrente do COVID-19.

Voltamos então, por ser agora mais atual e oportuno, a enfocar a discussão acerca dos percentuais de repasse do Valor Adicionado Fiscal (VAF) do ICMS, que, em todo exercício fiscal, é mensurado pelo Tribunal de Contas do Estado de Sergipe.


O VAF é um indicador econômico-contábil utilizado pelo Estado para calcular o índice de participação municipal no repasse de receitas da arrecadação do ICMS, sendo apurado com base em declarações anuais apresentadas pelas empresas estabelecidas nos respectivos municípios.

Dentro dessa ambiência, em Sergipe, os valores declarados por uma indústria do porte da Vale, em Rosário do Catete, por exemplo, são cotejados e tidos como de suma importância do momento em que o TCE calcula o perctual do VAF.

E, como a chamada “boca da mina” da Vale está situada em Rosário, muito se discute sobre a possiiblidade jurídica de outros municípios, cuja extração de minério pela companhia adentre o subsolo de seus territórios, tais quais Capela e Carmópolis, também participem da repartição do VAF.


Para bem delinear a hipótese, faz-se mister destacar o art. 20, § 1.º, da Constituição Federal, que assim estabelece:

Art. 20, § 1.º: “É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração”.

Percebe-se claramente que a norma constitucional é taxativa ao determinar que a participação na lavra será devida ao proprietário do solo, no momento em que positiva a “participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território”. Em complemento, a Lei n.º 7.990/89, que regulamentou a norma inserta na Carta Magna, assim estabeleceu em seu art. 1.º:

Art. 1.º: “O aproveitamento de recursos hídricos, para fins de geração de energia elétrica e dos recursos minerais, por quaisquer dos regimes previstos em lei, ensejará compensação financeira aos Estados, Distrito Federal e Municípios, a ser calculada, distribuída e aplicada na forma estabelecida nesta Lei”.

Haverá, portanto, compensação financeira pela exploração de minérios no território municipal, o que é realizado através da repartição do VAF, e tal compensação não pode ter natureza indenizatória, posto que possui como base para cálculo não o valor do dano causado em virtude da exploração, mas um percentual sobre o valor apurado com a venda do minério explorado, à luz do art. 176, § 2.º, da Constituição Federal:

Art. 176, § 2.º: “As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra.
(...)
§ 2.º É assegurada participação ao proprietário do solo nos resultados da lavra, na forma e no valor que dispuser a lei.
(...)”.


Assim, intui-se que a Carta Magna definiu a natureza participativa – e não natureza indenizatória – do VAF, e destacou sua vinculação ao princípio da territorialidade. Por tais razões que o art. 465-E, § 1.º, do Decreto Estadual n.º 21.400/2002, que regula a cobrança do ICMS em Sergipe, adota o princípio da territorialidade como alicerce de repartição do VAF:

Art. 465-E, § 1.º: “Em relação à produção de substâncias minerais, quando a área da jazida se estender por mais de um Município, a apuração será feita proporcionalmente, levando-se em consideração a área correspondente a cada Município, conforme concessão de lavra expedida pelo órgão competente”.

Está claro que o mens legis constitui-se na concessão de participação no resultado da exploração, pelo fato da exploração ser realizada em seu território. Trata-se tão somente de uma forma de fazer com que os Municípios obtenham receita proveniente da exploração mineral do seu subsolo, sem que esteja presente qualquer espécie de indenização pelos prejuízos decorrentes da lavra.

Na esgrima pelos repasses, neste cenário, o VAF deverá ser repartido entre os municípios por onde a Vale avance na exploração de seus respectivos subsolos – atualmente, Rosário do Catete, Capela e Carmópolis –, e não somente no local onde se situa o complexo industrial sobre a “boca da mina”.