Blogs
O ACESSO DOS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA AO SERVIÇO PÚBLICO: A INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE COMO FUNDAMENTO PARA A NOMEAÇÃO ALTERNADA – PARTE II

O certo é que, dentro deste complexo de proteção legal, merecem destaque, além do Texto Constitucional, a Lei n.º 7.853/89, a Lei n.º 8.112/90, o Decreto n.º 3.298/99, a Lei n.º 10.098/2000, a Lei n.º 13.146/2015 e o Decreto n.º 9.508/2018, que, de forma mais efetiva, porém cuidando de situações diversas, tratam dos direitos dos portadores de deficiência e de sua inclusão sócio-econômica.

 

Todavia, mesmo conduzidas pelo desejo de promover a inclusão social e econômica dos portadores de necessidades especiais, a Lei Fundamental de 1988 e as leis inferiores trazem em seu bojo algumas lacunas. E, dentre as omissões encontradas, destaca-se aquela que é objeto deste estudo.

 

Conforme alhures pincelado, o art. 37, VIII, da Constituição Federal prevê a reserva de vagas para cargos públicos destinadas aos portadores de necessidades especiais, remetendo à lei ordinária a estipulação dos percentuais a serem reservados quando do provimento.

 

A legislação inferior, buscando regular o art. 37, VIII, da Carta Constitucional, mensurou o mínimo (05%) e o máximo (20%) de vagas reservadas aos portadores de deficiência. Entretanto, a forma como seriam nomeados não foi prevista nem pela Constituição muito menos pelas leis ordinárias.

 

A ordem jurídica, portanto, neste particular, permaneceu silente, situação que perdura até os dias atuais, sem que estejam expressamente estabelecidos os parâmetros para que a reserva legal de vagas seja efetivamente preenchida.

 

Neste diapasão, emerge prejuízo para os candidatos portadores de necessidades especiais, posto que, malgrado lhes serem reservadas vagas, não há regras a respeito de sua convocação para o exercício do cargo. As instituições, assim, muitas vezes escondendo o intuito discriminatório que regia seus comandos, socorriam-se da discricionariedade que imperava – e ainda impera – nos atos administrativos para elaborar os editais e convocar vários candidatos não-portadores, sem fazer o mesmo com os portadores de deficiência, que necessitavam – como ainda necessitam – demandar judicialmente a nomeação.

 

Durante essa epopeia, em diversas oportunidades o prazo de validade do concurso se exauria e o candidato portador de deficiência, mesmo habilitado e com a garantia da reserva de vagas a seu favor, acabava excluído do certame.

 

A necessidade de políticas públicas capazes de propiciar aos portadores de necessidade especiais igualdade material de condições para a vida em sociedade é o ponto nevrálgico da hipótese, e, conforme já dito, é o desejo da Constituição Cidadã de 1988.

 

Pode-se dizer, por decorrência do texto constitucional, que esse direito decorre de alguns princípios ali consagrados, em especial o princípio da igualdade, nos moldes do art. 5.º, I, pois é imperativo tratar de forma igual os iguais e de forma desigual os desiguais.

 

Acrescente-se, também, o princípio da inclusão no mercado de trabalho, que, nos dias atuais, clama por profissionais cada vez mais gabaritados e tende a, infelizmente, rejeitar as pessoas portadoras de deficiência.

 

Ora, o trabalho, por certo, é instrumento de realização econômica, social e psicológica do ser humano, sem o qual não há como se falar em existência digna. Por isso mesmo tanto se tem procurado estabelecer mecanismos para garanti-lo.

 

A estabilidade no emprego e proteção contra despedidas arbitrárias, verbi gratia, representam apenas algumas das inúmeras intervenções estatais voltadas à proteção do trabalho.

 

No Brasil das últimas décadas, salvo raros períodos de aquecimento da economia, a recessão é uma tônica. E para os portadores de necessidades especiais, que têm de enfrentar, além da concorrência de mão-de-obra, barreiras arquitetônicas e culturais à sua aceitação no mercado produtivo, conseguir emprego é um desafio.

 

É por isso que a Constituição Federal determina a reserva e garante às pessoas portadoras de deficiência vagas em concursos públicos, empregos na iniciativa privada, acesso ao ensino regular, acesso aos logradouros de uso público, dentre outras ações públicas e privadas.

 

E desta complexa rede constitucional de amparo ao portador de necessidades especiais depreende-se a base matriz de sua proteção, a mola mestra da incessante busca por sua inserção sócio-econômica: o princípio da igualdade.

 

Do princípio da igualdade decorre toda e qualquer tentativa de inserção das minorias (portadores de deficiência, negros, dentre outros grupos), que, em várias oportunidades, é promovida através das chamadas ações afirmativas.

 

Aliás, em casos como o aqui analisado, cumpre abrir parênteses para lembrar que as discriminações legais são instrumentos normativos fundamentais para conferir eficácia plena e real ao princípio da igualdade. Nesse sentido é por demais conhecida a lição de Rui Barbosa, sobre a necessidade de "tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que eles se desigualam".

 

 (continua)