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ADVOCACIA FEMININA EM NOSSO TEMPO POR UMA IGUALDADE EFETIVA - PARTE FINAL

Tomemos a legislação como parâmetro. Quando do surgimento do Código Civil de 1916, não houve qualquer surpresa na previsão do regime dotal em seu art. 278 e seguintes, ainda que seu art. 279 expressamente ditasse que “o dote pode ser constituído pela própria nubente, por qualquer dos seus ascendentes, ou por outro” ou que o art. 280 rezasse que “o dote pode compreender, no todo, ou em parte, os bens presentes e futuros da mulher”.

Mesma naturalidade ocorreu com a redação original do caput do art. 233, ao dispor que “o marido é o chefe da sociedade conjugal”, sem sequer mencionar a existência da mulher na família, quiçá ceder relevância à sua participação familiar.

Ora, o Código Civil revogado refletia os costumes da época. Consequentemente, em 1916, nada se questionou sobre o regime dotal e a indisfarçada discriminação de gênero que representava, muito menos a alocação do homem como líder conjugal. Já em 2002, quando se erigiu o atual Código Civil, o regime dotal e a chefia familiar exclusiva do homem já eram impensáveis na sociedade, pois, no quase um século que separou ambas codificações, a mentalidade se alterou no sentido de que, discriminar as mulheres de forma a vincular suas núpcias ao dote do noivo ou coloca-las em posição inferior no seio da família, seria algo inimaginável.

É por essa senda que a sociedade deve transitar: implemento de um novo modo de pensar e agir, com valores outros sendo disseminados, prestigiados e estabelecidos.

A liberdade de pensamento leva à liberdade de agir, que, por sua vez, conduz à liberdade de escolha. É inadmissível que às mulheres seja vedado, ainda que de forma indireta – movida pelas alhures indicadas formas de discriminação –, o exercício de determinados papéis sociais, ou a elas sejam exclusivamente aplicadas determinadas reprimendas e censuras sociais.

O natural é que caiba a cada um dos membros da comunidade, sejam homens ou mulheres, caiba a livre, consciente e responsável escolha da forma como participarão das engrenagens sociais: não limitar o exercício de profissões por serem “exclusivamente masculinas”; não reprovar um jeito de ser por ser “exclusivamente masculino”; não impedir o acesso ao conhecimento por ser “exclusivo para homens”.

Para nós, advogadas, foram esses os paradigmas que quebramos para atingir a situação atual. Se, hoje, as mulheres predominam as bancas e nos cursos de Direito, se são as mais aprovadas nos exames da ordem, tudo foi fruto das conquistas de nossas antecessoras, e continuaremos na luta pela manutenção e ampliação desses direitos.

Paulatinamente, as mulheres advogadas vêm percebendo que detêm um leque de liberdades e que podem desfrutar dessas liberdades numa sociedade que está em constante evolução. Essa percepção deve ser disseminada, levando as advogadas a assumir um papel de liderança, independência, criatividade e demonstração de suas capacidades.

Somente assim os nichos discriminatórios que ainda existem serão superados. Às mulheres – não apenas as advogadas, mas todas elas – cabe assumir o local que merecem, guiadas pela liberdade de ser, viver, aspirar, desejar, liberdade esta capaz de revelar o correto e necessário caminho para a igualdade.