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Covid-19 pode ser considerada doença ocupacional? Quais as implicações da decisão do STF

No dia 29 de abril de 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu, em decisão liminar (sujeita ainda à análise de mérito), a eficácia de dois artigos da Medida Provisória 927/2020, que dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19).

 

De acordo com a decisão, tomada por maioria – inclusive em sentido contrário ao voto do relator (cujo acórdão ainda não foi publicado), foi suspensa a eficácia do artigo 29, que assim dispunha: “Art. 29. Os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal”.

 

Por si só a decisão não gera a presunção ou certeza de que será considerado acidente de trabalho, pois somente suspendeu o artigo que declarava o contrário, abrindo a possibilidade de caracterização do covid-19 como doença ocupacional, independente da comprovação de nexo causal laboral, na tese da responsabilidade objetiva.

 

 

O que é doença ocupacional?

 

Doença ocupacional é uma expressão genérica utilizada para definir várias doenças que causam alterações na saúde do trabalhador, provocadas por fatores relacionados com o ambiente de trabalho.

 

A legislação previdenciária tipifica como doença ocupacional a “doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade” caracterizada pelo nexo técnico epidemiológico e a “doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente”.

 

Alcance da decisão do STF

 

O posicionamento do STF não tem tanto ineditismo assim, para ser alardeado com a falsa premissa de que a contaminação pelo novo coronavírus será considerada doença ocupacional.

 

A referida discussão já ocorreu em julgamentos anteriores do próprio STF (como também no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho), pela possibilidade de responsabilização objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho e/ou doenças ocupacionais, com aplicação da teoria do risco, prevista no art. 927, parágrafo único, do Código Civil, independentemente de culpa, quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

 

Por outro lado, mesmo com esse posicionamento do STF, para que ocorra a caracterização da contaminação como doença ocupacional, deverá ter a efetiva comprovação de que o empregado adquiriu a doença no trabalho e em decorrência deste e, a margem da responsabilidade objetiva (que é exceção na nossa legislação) e de atividades que potencialmente poderiam causar risco de contaminação (a exemplo de estabelecimentos de saúde), para que seja caracterizado doença ocupacional deverá estar presente a culpa do empregador na contaminação.

 

Efeitos práticos da decisão para as empresas

 

Na prática, para as empresas (empregadores), a decisão do STF deverá ser interpretada como um alerta necessário e importante que visa provocar a reavaliação das medidas de controle ocupacional, especialmente daquelas consideradas como atividades essenciais e que permanecem em operação/funcionamento durante a pandemia do covid-19.

 

Os empregadores, no mínimo, deverão cumprir com todas as medidas recomendadas pelas autoridades de saúde e sanitárias (especialmente fornecimento de máscaras, luvas, manutenção do distanciamento e controle de temperatura), bem como definir os possíveis riscos trabalhistas e previdenciários decorrentes da eventual presença do coronavírus em seus ambientes de trabalho.

 

Outro fator importante para os empregadores é adotar medidas imediatas em relação aos empregados que porventura apresentarem sintomas ou que tenham testado positivo para o covid-19, afastando-os do local de trabalho, na forma prevista legalmente.

 

Todas as medidas adotadas deverão estar sustentadas em registros documentais e outros meios de comprovação, para que em eventual demanda trabalhista/previdenciária dos empregados, ou mesmo processos fiscalizatórios dos órgãos competentes, os empregadores tenham provas das cautelas adotadas e do cumprimento das medidas obrigatórios e/ou recomendadas pelas autoridades da saúde e sanitárias.